Momentos de crise econômica atingem em cheio as pequenas empresas de manutenção automotiva. Em uma situação tão dramática para a sociedade como a imposta pela pandemia do novo coronavírus, a tendência é que as consequências sejam duras para as oficinas com uma gestão menos estruturada. Para ter uma percepção da extensão do problema causado pela Covid-19 e quais medidas tomar para sanar os pontos fracos do negócio, conversamos com José Paulo Albanez Ferreira Luscri, coordenador Estadual do Sebrae-SP (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para o setor de manutenção e reposição automotiva. Ele defende que a visão empresarial na gestão é crucial para o mecânico dono de seu negócio manter a saúde e a perenidade da oficina em meio a períodos de instabilidade como atualmente.
REVISTA O MECÂNICO: Em meio à pandemia, oficinas mecânicas foram liberadas para trabalhar em todo o Brasil, com restrições pontuais mais ou menos rígidas em alguns Estados. Porém, o movimento caiu vertiginosamente – há estudos que falam em queda de 50% no uso de carros nos principais centros urbanos do país já na terceira semana de março, no início da quarentena. Como você viu essa mudança de cenário nas empresas de reparo de automóveis que você tem contato?
JOSÉ PAULO ALBANEZ: O cenário foi drástico para a maioria das pequenas empresas deste setor. Apesar de continuarem abertas, o movimento caiu muito. Na primeira semana havia serviços sendo reparados e algumas entregas. Nas semanas seguintes, sentiu-se o impacto com a ausência dos clientes. Principalmente o setor de colisão (oficinas de funilaria e pintura e demais relacionadas) que, com a redução da circulação de veículos, praticamente não ocorreram acidentes, afetando diretamente o envio de veículos para reparos via seguradoras.
Em sua maioria, os proprietários de oficina se consideram mecânicos e não donos de empresa
O MECÂNICO: Evidentemente, não há como se preparar para uma situação como esta que vivemos, sem precedentes na história recente da humanidade. Mas quais medidas uma oficina mecânica deveria já ter implementado que amenizariam não só esse problema como outras possíveis situações de crise econômica menos severas?
ALBANEZ: Ter um relacionamento mais pró-ativo com o cliente, não aguardando seu retorno, mas alertando e divulgando a necessidade de uma manutenção preventiva; oferecer cortesias para indicação de novos clientes; comunicar-se mais os clientes em datas de aniversário, período de férias e feriados, informando sobre o desgaste das peças e a necessidade das revisões (troca de óleo, pastilhas, filtros, higienizar ar-condicionado etc). Outra medida é não aguardar o retorno do cliente espontâneo ou na quebra do veículo e, sim, implantar um conceito de prevenção aos reparos. Fica mais barato e agradável ao cliente ser alertado deste problema.
O MECÂNICO: No passado, mecânicos altamente técnicos e competentes se tornaram donos de oficina sem ter a visão de que a oficina é uma empresa prestadora de serviços que demanda uma gestão focada. Muitos deles só procuravam ajuda e/ou especialização em negócios depois que os problemas estavam estabelecidos. Isso ainda continua acontecendo ou o proprietário de oficina atualmente já entende que a oficina é uma empresa e deve ser gerida como tal?
ALBANEZ: Infelizmente, em sua maioria, os proprietários se consideram mecânicos e não donos de empresa. Normalmente, a parte administrativa-financeira é deixada para a esposa ou filha, e a preocupação do empresário é se especializar e atualizar na parte operacional. Poucos têm a visão de acompanhar com zelo os controles financeiros. Exatamente um dos grandes problemas apontados pelas pequenas empresas nesta crise do Covid-19 é a empresa não suportar muito tempo sem faturamento, ou seja, não tem um capital de giro para se manter em tempos difíceis, como estamos vivendo neste instante. Falta de um planejamento eficiente.
Um dos grandes problemas (…) é a empresa não suportar muito tempo sem faturamento, ou seja, não tem um capital de giro
O MECÂNICO: Quais são os principais vícios de gestão que você vê nas oficinas mecânicas e por que esses vícios ainda persistem em nosso mercado?
ALBANEZ: Como comentei, focar muito na parte operacional. Realmente, é um grande desafio se manter competitivo neste mercado de manutenção automotiva. As novidades são constantes, é preciso acompanhar as mudanças tecnológicas constantes, vários modelos, diversas montadoras, é difícil com certeza. Mas o empresário precisa dedicar um tempo todos os dias para acompanhar a situação financeira da empresa. Também, ter uma meta de buscar novos clientes sempre. As gerações estão mudando, não querem adquirir carros, preferem compartilhar. Inclusive os mais velhos se desfazendo dos veículos para utilizar outro modelo de transporte.
O MECÂNICO: Muitos profissionais que sonham em fazer da sua oficina seu meio de vida vão ter que se reconstruir financeira e mentalmente depois que toda essa situação passar. Por onde (re)começar? Quais são as linhas mestras para conseguir fazer da oficina uma empresa perene?
ALBANEZ: A economia como um todo irá refletir e será necessário criar uma nova forma de se posicionar no mercado. No caso das oficinas mecânicas e as de funilaria e pintura, mais ainda. É preciso estabelecer um novo perfil para se comunicar e atrair o cliente, oferecendo confortos como o sistema leva e traz, utilizar muito as redes sociais para ser lembrado e, no caso das Funilarias e Pintura, não depender tanto das seguradoras para prestar seus serviços.
A economia como um todo irá refletir e será necessário criar uma nova forma de se posicionar no mercado
O MECÂNICO: O Sebrae oferece programas específicos para ajudar na gestão de oficinas mecânicas e demais tipos de centros automotivos?
ALBANEZ: Muito importante esta pergunta. O Sebrae tem programas voltados exclusivamente para atender o público da manutenção automotiva. É um programa de 45 horas em 4 meses, no período noturno, onde o empresário receberá informações sobre controles financeiros, planejamento, atendimento ao cliente, gestão das pessoas para evitar conflitos e manter os talentos em sua empresa. Além disso, terá direito a 5 horas de consultoria na sua empresa para esclarecer alguns pontos e tornar o negócio mais competitivo.
O MECÂNICO: Na sua opinião, depois que a Covid-19 passar, oficinas mecânicas ainda serão um negócio lucrativo?
ALBANEZ: Creio que esse período da Covid-19 serviu de alerta para as pequenas empresas, principalmente, que são o nosso público. Vamos utilizar este aprendizado para investir mais no planejamento e nos controles internos, que só ajudam no dia a dia das empresas, tornando-as mais organizadas, com custos controlados, gerando mais lucro aos empresários, este é o caminho.
Mais informações: SEBRAE: 0800-570-0800
Por Fernando Lalli
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